
Portfólio


2007-2021 e antes
Galvanda Galvão
Poderia me apresentar ao avesso? A pergunta para percorrer territórios, os tempos, por entre os contrários seria adnavlag, assim em minúsculas letras, de algum modo adentrar as frestas. Correspondências e tentativas de ser própria, insana numa sociedade de consumo, nadar contra a maré ou como disse Duchamp: "eu não fiquei apenas boiando! Eu tive oito anos de natação.” Estudei dramaturgia no teatro de Arena Eugênio Kusnet – SP. Uma experiência em diálogo com a cidade, as lâminas nas palavras: sou quando não estou ou estou mais quando não sou? Percursos dadaísta, poesia, colagens, fotografia, estilhaços sonoros em uma produção sibilante, histórias e invenções. Com a fotografia materializo o movimento? As cenas da cidade em dissolução, a brincadeira em oposição a reprodutibilidade, o deslocamento como mote, traços da voz e do silêncio em meio a transitoriedade: Clarice Lispector, Hilda Hilst, Artaud, Brecht, Gertrude Stein, Octavio Paz, Khlebnikov, Chantal, Agnes Varda, Maya Deren, muitxs, etc. Trans-formar o que está dentro, o que está fora. Tocar o impossível, as imagens “invisíveis” numa videoarte a partir de HILDA HILST, de sua obra no PPGARTES em Poéticas e Processos de Atuação em Artes – Linha 1 - diálogo entre as artes.
Videoartista, colagista, fotógrafa, professora e escritora do livro UMLANCEDEDENTES da Edições Do Escriba & uxi.cão, 2017, reedição, 2019 e AMENINAANOLIMOC da editora uxi. Cão, 2013. Sou pesquisadora do PPGARTES-UFPA em Cinema sob orientação do Prof. Dr. Orlando Maneschy. Este ano em suspensão preparei uma videoarte em diálogo com Clarice Lispector, O Búfalo Outro Eu; desenho de som de Gilberto Mendonça e trilha de Lívio Tragtenberg. Participei do Encontro Internacional de Artes Visuais TERRITÓRIOS no CCBEU-PA e Na Casa do Artista de Icoaraci, setembro 2019; Exposição TENHO MEDO DE PERDER ESTE SILÊNCIO na Casa das Artes- FCP-PA e do projeto Literatura por Elas na Casa da Linguagem - FCP - 2018 e 2019. Fotomontagem para livros de Izabela Leal, Marcelo Ariel e Vicente Franz Cecim, impressões impossíveis com poesia e fotografia na Marca d'água pela Fotoativa-PA. Participo da Exposição virtual RESPIRO na Galeria de arte CCBEU-MABEU eProjeto plataforma KAQUIADO do Preamar de Cultura e Arte da Fundação Cultural do Pará coordenado por Felipe Pamplona 2020. Há mais de 4 anos pela @sibilafilmes com experimentações audiovisuais e há 3 anos com Yvana Crizanto, Monica Lizardo, Josi Mendes no Projeto @cidadeemfrestas para expandir a poesia a rua adentrar o rio, arte em deslocamento. Neste ano em suspensão com covid-19 passamos a produzir programas com voz expandida RADIO ESTAMIRA, transmitida, principalmente, pelos aparelhos celulares através de whatsapp, com Monica Lizardo, Márcio Mariath, Yvana Crizanto.
@nacasadoartista @sibilafilmes @cidadeemfrestas
@galvaogalvanda galvandagalvao@gmail.com
Youtube galvandagalvao

@capa colagem para Vicente Franz Cecim - Lisboa-Portugal no prelo.

Cultura Samba na Gamboa entra no clima de Carnaval com sucessos do axé. Página 5. TRABALHO TEM PARCERIAS DE ELOI IGLESIAS, THAIS BADU E DONA ONETE Cantor e compositor Juca Culatra lança o clipe “Me dá teu cupuaçu” . Página 2. TEATRO “Casa das Madalenas” volta ao palco com nova montagem e elenco.Página6. BELÉM, QUARTA-FEIRA, 12 DE FEVEREIRO DE 2020'
CIDADE EM F(R)ESTAS' CHEGA A SALVATERRA INTERCÂMBIO - Projeto cultural reúne varal de fotos, poesias e desenhos, mostra de curtas, música, oficinas e desfile de moda.
Salvaterra, no Marajó, recebe o "Cidade em F(r)estas", nesta sexta-feira e sábado, 14 e 15. O projeto criado por artistas de Belém promove o intercâmbio com artistas locais por meio de oficinas de arte, exibição de curta-metragens, varal de exposição de fotografias, poesia e desenhos, desfile de moda e show de carimbó. Mais do que uma intervenção artística no território marajoara, o Cidade em F(r)estas é resultado do processo colaborativo em que a moradores de Salvaterra cedem espaços em casas e instituições de vários bairros para as atividades do evento. A edição de Salvaterra é a primeira imersão fora de Belém realizada pelo projeto idealizado há quase dois anos pelas artistas visuais Roberta Mártires e Galvanda Galvão, a produtora Josi Mendes e a jornalistas e cantora Yvana Crizanto. "Começamos exibindo filmes e realizando o foto-varal na Praça do Carmo e em outros pontos do bairro da Cidade Velha. No início, a intenção era ocupar as ruas, perder o medo, pois quanto mais gente, mais seguro fica, e também de conhecer a vizinhança. As atividades do projeto foram crescendo, surgindo outros parceiros, e fizemos a primeira edição fora do bairro, que foi na Pedreira", descreve Roberta. E, para este ano, já estão sendo planejadas novas edições em Belém, no distrito de Icoaraci e no bairro da Marambaia. Uma das parceiras que surgiu pelo caminho foi a artista visual Moniza Lizardo. Ela promove o desfile de moda Plano 14, da Vestigium, trazendo roupas criadas por ela a partir das estampas de fotografias da paisagem natural destruída no Xingu, Sudeste Paraense. “A coleção traz imagens de trecho do rio Xingu, com suas árvores mortas, fantasmagóricas: é um dos resultados da implantação de uma hidrelétrica (Belo Monte) na região. Através das roupas, a fotografia da paisagem se insere no corpo e nele revive como um grito, pela sacralidade da vida nos rios da Amazônia”, conta Lizardo. Os artistas que participam levando as criações para comercializar no evento, não pagam taxas para participar: "A gente estende o fio (do varal usado para a mostra) e a população, principalmente os artistas locais, vão lá e colocam. Não tem curadoria. É uma forma de a gente conhecer o trabalho deles e eles conhecerem o nosso", explica Roberta. Durante os dois dias de projeto serão realizadas as oficinas de “Papietagem”, com Paulo Emílio, e “Crochê Criativo”, com Roberta Mártires. As oficinas são destinadas aos públicos de todas as idades. O objetivo é viabilizar a troca de saberes, ideias e processos artísticos. Não foi fixada taxa para a inscrição, pois, como a proposta das oficinas é colaborativa, foi definido o sistema de "pague quanto puder" aos participantes. A papietagem é uma das formas de uso do papel machê, com o qual o artista plástico Paulo Emílio elabora peças fantásticas e lúdicas, retratando cenas locais, objetos de decoração, peças de expressão política e referências musicais e literárias. Ele é um dos mestres da técnica no Pará. “A partir da técnica de crochê eu criei as minhas técnicas. Como Belém é uma cidade quente, eu comecei a pensar o crochê para fazer peças que ficassem mais leves e que a gente pudesse usar no nosso clima. Essas técnicas eu chamo de crochê criativo. Na oficina que eu vou dar em Salva
DIOGO NOGUEIRA RECEBE ASTROS DA MÚSICA BAIANA
Cultura
Samba na Gamboa entra no clima de Carnaval com sucessos do axé. Página 5.
TRABALHO TEM PARCERIAS DE ELOI IGLESIAS, THAIS BADU E DONA ONETE
Cantor e compositor Juca Culatra lança o clipe “Me dá teu cupuaçu” . Página 2.
TEATRO “Casa das Madalenas” volta ao palco com nova montagem e elenco. Página 6.
BELÉM, QUARTA-FEIRA, 12 DE FEVEREIRO DE 2020 ENIZE VIDIGAL DA REDAÇÃO 'CIDADE EM F(R)ESTAS' CHEGA A SALVATERRA INTERCÂMBIO - Projeto cultural reúne varal de fotos, poesias e desenhos, mostra de curtas, música, oficinas e desfile de moda
DIVULGAÇÃO
terra, eu vou ensinar a fazer um xale, que pode ser uma travessa ou pode amarrar na cintura, mas é uma peça cumprida, como se fosse um xale”, explica Roberta. Segundo ela, além de dispensar o uso de agulhas, a oficina pode ser feita por qualquer pessoa, pois o participante não precisa ter conhecimento prévio de crochê. “Eu faço ponto baixo com os dedos e não precisa de agulha. Então a oficina é pague-o-quanto-puder e não precisa levar material, que eu vou levar daqui”. Ainda, serão exibidos aos moradores de Salvaterra o clipe "Sou Preta", da cantora Thaís Badu; episódios da série de animação "Os Dinâmicos"; e os curtas do Cine Direitos Humanos, da Faculdade de Direito da UFPA; "Ervas e Saberes da Amazônia" e "A Onda: uma festa na Pororoca". Também a exposição itinerante "Mundo Cão" vai reunir artistas e fotógrafos para compartilhar na rua em fotovaral aberto para fotografias, pinturas, colagens, performances e outras formas de arte. “Percursos em fluxos a partir de convite de organizações parceiras e moradores, tendo a rua como travessia. As cenas são estes desenhos flagrados no click no traço para dar a ver as cenas delicadeza e violência abertas ao olhar”, aponta Galvanda. A programação encerra com um show realizado por artistas locais e um cortejo de carimbó da Pousada Boto até a praia, no sábado. O Cidade em F(r)estas está integrado com os coletivos Casulo Cultural, Casa Velha, Aparelho, Holofote Virtual, Sibilafilmes e Multifário, que levam para as ruas uma programação multiartes com projeções de videoartes, curtas, animação, documentários, em meio a fotovaral e apresentações de música, performances e teatro, as artes.



Belém 16x16 (ebook, 2017 ) – SESCBoulevard-PA

sem título/2018

Belém 16x16 – 2015.

Livro em serigrafia com poesia e fotografias com Arte de Marcilio Costa – Edições Do Escriba & UXI.CÃO, 2017 – Lancçada na Marca d'água, feira de impressos e publicações na FOTOATIVA.





Fotografar a cidade, as cenas em movimento, passar por caminhos inventados aos choques, encantamento e malassombro, como disse Benjamin em Diário de Moscou (1989) , incursão e imersão para conhecer a “fisionomia” do lugar em rede. As travessas e a multidão, curiosamente, o sítio da solidão, homens, mulheres, coisas sob o imperioso tempo: oxidado em memórias, tentativa de deixar marcas no lugar. Movimento em contraposição que como alegoria, entre sombras e luzes focaliza espectadores, cidadãos, partícipes e consumidores: sem interrogar, por que? O impossível diálogo, a fala e o silêncio, um território expandido aberto a pesquisa como projeto na obra de HILDA HILST: o corpo, a casa, as dobras - itinerários do dizível.
As cenas são desenhadas pelo corte, as sinestesias a nos arremessar uma cidade em decomposição, fragmentos e a modernidade dá a ver a ruína, vestígio singular de um tempo, onde a massa irrompe em subjetividade e subserviência, nas dobras das imagens os processos em ambivalência, desvela o sem nome, o itinerário, a coisa num jogo circular de inacabamento.



https://br.eventbu.com/belem/entre-artes-o-olhar-e-a-palavra/5500806
https://bacana.news/dialogo-sobre-linguagens-artisticas-movimenta-casa-das-artes/
http://ameninaanolimoc.blogspot.com.br/
https://revistapolichinello.com.br
https://www.katawixi.com/literatura
(http://www.correiodoporto.pt/historias-em-postais/saltar-o-rio
https://www.katawixi.com/single-post/2016/05/29/A-menina-comilona-ou-a-arte-de-sentir-arrepios-
transversais-1
Anexos
NAM SIBYLLAM
(Galvanda Galvão e Izabela Leal)
A videoarte “Nam Sibyllam” discute a presença do poeta norte-americano T. S. Eliot (1888-1965) na obra do poeta piauiense Mário Faustino (1930-1962). Escrito em 1922, o longo poema de Eliot intitulado “The Waste Land” é considerado um marco da poesia moderna. A poética do fragmento que Eliot cultivou em seus poemas pode ser observada nas cinco partes que o compõem, sendo o fragmento IV, “Death by Water”, um dos mais conhecidos e comentados. Há aqui uma nítida relação entre Faustino-poeta e Faustino-leitor/tradutor de T. S. Eliot, relação guiada pelo lema de Ezra Pound: “repetir para aprender, criar para renovar”.
Ficha técnica:
Direção: Galvanda Galvão e Izabela Leal
Produção: Galvanda Galvão
Fotografia: Izabela Leal
Roteiro: Izabela Leal
Performance : Danielle Grace e Rodrigo Brito
Voz: Silvia Benchimol
Edição de som: Gilberto Mendonça
Montagem: Gilberto Mendonça
Baseado na dissertação de Dayana Crystina Barbosa de Almeida, “Mário Faustino e seus ciclos tradutórios”.
TRANSLUCIFERAÇÃO
(eu vendi minha alma pra fazer a luz e a luz reluz mas não produz nada na minha retina – Gertrude Stein, Doutor Faustus liga a luz. Tradução de Fábio Fonseca de Melo)
Baseado na peça Doutor Faustus liga a luz, da escritora norte-americana Gertrude Stein, o curta Transluciferação (2016) propõe um diálogo entre imagem, música e poesia, apresentando um percurso pela cidade e um discurso sobre a cidade. Filmado em Belém do Pará, o curta retoma o tema do Fausto para repensar a modernidade a partir dos processos de industrialização e das aglomerações urbanas, de onde se desdobram labirintos, caminhos e linguagens em circularidade. O tema central da peça de Gertrude Stein é a subjetividade ofuscada pela “luz elétrica” e pelos dispositivos de aceleração do tempo, a partir dos quais se constituem o saber e a negociação sobre o conhecimento. O título do curta remete a Lúcifer, figura evocada pelo poeta Haroldo de Campos, que criou esse termo como uma provocação desenvolvida ao longo de sua tradução do Fausto, de Goethe.
Ficha Técnica:
Videoarte
Galvanda Galvão & Izabela Leal
Voz
Deyse Marinho Galvanda Galvão Izabela Leal
Performance
Chloe Guerra Arlin
Galvanda Galvão
Fotografia
Izabela Leal
Edição
Edson Palheta
Finalização
José Viana
Produção
Galvanda Galvão
Texto
Gertrude Stein “Dr. Faustus Liga a Luz”
Tradução
Fábio Fonseca de Melo
Música
Livio Tragtenberg
3’45 – 2016
sibil@filmes
ENTRE O ANJO E O POLICHINELO
Por volta de 1950 o poeta Paulo Plínio Abreu lançou-se em um projeto ousado e desafiador: traduzir as Elegias de Duíno, de Rainer Maria Rilke. A videoarte “Paulo Plínio Abreu – Rilke: entre o anjo e o polichinelo”, de Galvanda Galvão e Izabela Leal, expõe, a partir de várias linguagens – cinema, poesia, fotografia, música, escultura – as imagens do anjo e do polichinelo que atravessam as poéticas de ambos os autores, propondo uma concepção de tempo não linear, descontínuo. Descortina-se aí o lugar do poeta, que assim como o trapeiro, ressignifica os dejetos produzidos pela sociedade capitalista.
Ficha Técnica:
Direção: Galvanda Galvão e Izabela Leal
Edição de Som: Gilberto Mendonça
Fotografia: Izabela Leal
Legenda: José Viana
Montagem: Gilberto Mendonça
Pesquisa: Jairo Vansiler
Produção: Galvanda Galvão
Roteiro: Izabela Leal
Duração: 6'27
Data: 2017
Origem: Belém, Pará, Brasil.
CARTAS (E)VIDENTES
A videoarte “Cartas (e)videntes” apresenta uma leitura expandida das Cartas portuguesas de Mariana Alcoforado, transportando o horizonte da freira enclausurada do século XVII para o mundo contemporâneo, em que a experiência passional surge permeada de “amarrações amorosas” tão comuns em nossa época. As cinco cartas de Mariana desdobram-se na performance de cinco mulheres, exibindo desejo e dor, paixão e abandono num processo de montagem cinematográfica. Dissonantes no cenário da escrita marcado por homens, as Cartas foram consideradas desde sempre um ícone da ousadia feminina, mesmo que a questão de sua autoria não tenha até hoje sido comprovada. A ultrapassagem do corpo e da paixão amorosa faz surgir uma nova sensibilidade: a mulher escritora cuja voz salta fronteiras e ecoa em tempos múltiplos e diversos, disseminando a sua índole cada vez mais transgressora.
Ficha Técnica:
Direção
Galvanda Galvão & Izabela Leal
Performance
Andréa Estevão
Chole Guerra
Daniele Bloris
Galvanda Galvão
Juliana Queiroz
Edição e desenho de som
José Viana
Fotografia
Izabela Leal
Roteiro
Galvanda Galvão
baseado nas Cartas Portuguesas de Mariana Alcoforado
Legendagem
Fábio Fonseca de Melo
Voz
Galvanda Galvão
Cães
Açai
Maré
Pitanga
Uxi
Produção
Galvanda Galvão
09’ 15
Sibilafilmes 2017
Belém - PA
https://sibilafilmes.wixsite.com/sibilafilmes
ANEXO O Búfalo de Clarice Lispector (RJ.: Francisco Alves, 1960)
O BÚFALO
Mas era primavera. Até o leão lambeu a testa glabra da leoa. Os dois animais louros. A mulher desviou os olhos da jaula, onde só o cheiro quente lembrava a carnificina que ela viera buscar no Jardim Zoológico. Depois o leão passeou enjubado e tranquilo, e a leoa lentamente reconstituiu sobre as patas estendidas a cabeça de uma esfinge. “Mas isso é amor, é amor de novo”, revoltou-se a mulher tentando encontrar-se com o próprio ódio mas era primavera e dois leões se tinham amado. Com os punhos nos bolsos do casaco, olhou em torno de si, rodeada pelas jaulas, enjaulada pelas jaulas fechadas. Continuou a andar. Os olhos estavam tão concentrados na procura que sua vista às vezes se escurecia num sono, e então ela se refazia como na frescura de uma cova. Mas a girafa era uma virgem de tranças recém-cortadas. Com a tola inocência do que é grande e leve e sem culpa. A mulher do casaco marrom desviou os olhos, doente, doente. Sem conseguir – diante da aérea girafa pousada, diante daquele silencioso pássaro sem asas – sem conseguir encontrar dentro de si o ponto pior de sua doença, o ponto mais doente, o ponto de ódio, ela que fora ao Jardim Zoológico para adoecer. Mas não diante da girafa que mais era paisagem que um ente. Não diante daquela carne que se distraíra em altura e distância, a girafa quase verde. Procurou outros animais, tentava aprender com eles a odiar. O hipopótamo, o hipopótamo úmido. O rolo roliço de carne, carne redonda e muda esperando outra carne roliça e muda. Não. Pois havia tal amor humilde em se manter apenas carne, tal doce martírio em não saber pensar. Mas era primavera, e, apertando o punho no bolso do casaco, ela mataria aqueles macacos em levitação pela jaula, macacos felizes como ervas, macacos se entrepulando suaves, a macaca com olhar resignado de amor, e a outra macaca dando de mamar. Ela os mataria com quinze secas balas: os dentes da mulher se apertaram até o maxilar doer. A nudez dos macacos. O mundo que não via perigo em ser nu. Ela mataria a nudez dos macacos. Um macaco também a olhou segurando as grades, os braços descarnados abertos em crucifixo, o peito pelado exposto sem orgulho. Mas não era no peito que ela mataria, era entre os olhos do macaco que ela mataria, era entre aqueles olhos que a olhavam sem pestanejar. De repente a mulher desviou o rosto: é que os olhos do macaco tinham um véu branco gelatinoso cobrindo a pupila, nos olhos a doçura da doença, era um macaco velho – a mulher desviou o rosto, trancando entre os dentes um sentimento que ela não viera buscar, apressou os passos, ainda voltou a cabeça espantada para o macaco de braços abertos: ele continuava a olhar para a frente. “Oh não, não isso”, pensou. E enquanto fugia, disse: “Deus, me ensine somente a odiar.” “Eu te odeio”, disse ela para um homem cujo crime único era o de não amá-la. “Eu te odeio”, disse muito apressada. Mas não sabia sequer como se fazia. Como cavar na terra até encontrar a água negra, como abrir passagem na terra dura e chegar jamais a si mesma? Andou pelo Jardim Zoológico entre mães e crianças. Mas o elefante suportava o próprio peso. Aquele elefante inteiro a quem fora dado com uma simples pata esmagar. Mas que não esmagava. Aquela potência que no entanto se deixaria docilmente conduzir a um circo, elefante de crianças. E os olhos, numa bondade de velho, presos dentro da grande carne herdada. O elefante oriental. Também a primavera oriental, e tudo nascendo, tudo escorrendo pelo riacho. A mulher então experimentou o camelo. O camelo em trapos, corcunda, mastigando a si próprio, entregue ao processo de conhecer a comida. Ela se sentiu fraca e cansada, há dois dias mal comia. Os grandes cílios empoeirados do camelo sobre olhos que se tinham dedicado à paciência de um artesanato interno. A paciência, a paciência, a paciência, só isso ela encontrava na primavera ao vento. Lágrimas encheram os olhos da mulher, lágrimas que não correram, presas dentro da paciência de sua carne herdada. Somente o cheiro de poeira do camelo vinha de encontro ao que ela viera: ao ódio seco, não a lágrimas. Aproximou-se das barras do cercado, aspirou o pó daquele tapete velho onde sangue cinzento circulava, procurou a tepidez impura, o prazer percorreu suas costas até o mal-estar, mas não ainda o mal-estar que ela viera buscar. No estômago contraiu-se em cólica de fome a vontade de matar. Mas não o camelo de estopa. “Oh, Deus, quem será meu par neste mundo?” Então foi sozinha ter a sua violência. No pequeno parque de diversões do Jardim Zoológico esperou meditativa na fila de namorados pela sua vez de se sentar no carro da montanha-russa. E ali estava agora sentada, quieta no casaco marrom. O banco ainda parado, a maquinaria da montanha-russa ainda parada. Separada de todos no seu banco parecia estar sentada numa Igreja. Os olhos baixos viam o chão entre os trilhos. O chão onde simplesmente por amor – amor, amor, não o amor! – onde por puro amor nasciam entre os trilhos ervas de um verde leve tão tonto que a fez desviar os olhos em suplício de tentação. A brisa arrepiou-lhe os cabelos da nuca, ela estremeceu recusando, em tentação recusando, sempre tão mais fácil amar. Mas de repente foi aquele voo de vísceras, aquela parada de um coração que se surpreende no ar, aquele espanto, a fúria vitoriosa com que o banco a precipitava no nada e imediatamente a soerguia como uma boneca de saia levantada, o profundo ressentimento com que ela se tornou mecânica, o corpo automaticamente alegre – o grito das namoradas! – seu olhar ferido pela grande surpresa, a ofensa, “faziam dela o que queriam”, a grande ofensa – o grito das namoradas! – a enorme perplexidade de estar espasmodicamente brincando, faziam dela o que queriam, de repente sua candura exposta. Quantos minutos? os minutos de um grito prolongado de trem na curva, e a alegria de um novo mergulho no ar insultando-a como um pontapé, ela dançando descompassada ao vento, dançando apressada, quisesse ou não quisesse o corpo sacudia-se como o de quem ri, aquela sensação de morte às gargalhadas, morte sem aviso de quem não rasgou antes os papéis da gaveta, não a morte dos outros, a sua, sempre a sua. Ela que poderia ter aproveitado o grito dos outros para dar seu urro de lamento, ela se esqueceu, ela só teve espanto. E agora este silêncio também súbito. Estavam de volta a terra, a maquinaria de novo inteiramente parada. Pálida, jogada fora de uma Igreja, olhou a terra imóvel de onde partira e aonde de novo fora entregue. Ajeitou as saias com recato. Não olhava para ninguém. Contrita como no dia em que no meio de todo o mundo tudo o que tinha na bolsa caíra no chão e tudo o que tivera valor enquanto secreto na bolsa, ao ser exposto na poeira da rua, revelara a mesquinharia de uma vida íntima de precauções: pó de arroz, recibo, caneta-tinteiro, ela recolhendo do meio-fio os andaimes de sua vida. Levantou-se do banco estonteada como se estivesse se sacudindo de um atropelamento. Embora ninguém prestasse atenção, alisou de novo a saia, fazia o possível para que não percebessem que estava fraca e difamada, protegia com altivez os ossos quebrados. Mas o céu lhe rodava no estômago vazio; a terra, que subia e descia a seus olhos, ficava por momentos distante, a terra que é sempre tão difícil. Por um momento a mulher quis, num cansaço de choro mudo, estender a mão para a terra difícil: sua mão se estendeu como a de um aleijado pedindo. Mas como se tivesse engolido o vácuo, o coração surpreendido. Só isso? Só isto. Da violência, só isto. Recomeçou a andar em direção aos bichos. O quebranto da montanha-russa deixara-a suave. Não conseguiu ir muito adiante: teve que apoiar a testa na grade de uma jaula, exausta, a respiração curta e leve. De dentro da jaula o quati olhou-a. Ela o olhou. Nenhuma palavra trocada. Nunca poderia odiar o quati que no silêncio de um corpo indagante a olhava. Perturbada, desviou os olhos da ingenuidade do quati. O quati curioso lhe fazendo uma pergunta como uma criança pergunta. E ela desviando os olhos, escondendo dele a sua missão mortal. A testa estava tão encostada às grades que por um instante lhe pareceu que ela estava enjaulada e que um quati livre a examinava. A jaula era sempre do lado onde ela estava: deu um gemido que pareceu vir da sola dos pés. Depois outro gemido. Então, nascida do ventre, de novo subiu, implorante, em onda vagarosa, a vontade de matar – seus olhos molharam-se gratos e negros numa quase felicidade, não era o ódio ainda, por enquanto apenas a vontade atormentada de ódio como um desejo, à promessa do desabrochamento cruel, um tormento como de amor, a vontade de ódio se prometendo sagrado sangue e triunfo, a fêmea rejeitada espiritualizara-se na grande esperança. Mas onde, onde encontrar o animal que lhe ensinasse a ter o seu próprio ódio? o ódio que lhe pertencia por direito mas que em dor ela não alcançava? onde aprender a odiar para não morrer de amor? E com quem? O mundo de primavera, o mundo das bestas que na primavera se cristianizam em patas que arranham mas não dói… oh não mais esse mundo! não mais esse perfume, não esse arfar cansado, não mais esse perdão em tudo o que um dia vai morrer como se fora para darse. Nunca o perdão, se aquela mulher perdoasse mais uma vez, uma só vez que fosse, sua vida estaria perdida – deu um gemido áspero e curto, o quati sobressaltou-se – enjaulada olhou em torno de si, e como não era pessoa em quem prestassem atenção, encolheu-se como uma velha assassina solitária, uma criança passou correndo sem vê-la. Recomeçou então a andar, agora apequenada, dura, os punhos de novo fortificados nos bolsos, a assassina incógnita, e tudo estava preso no seu peito. No peito que só sabia resignarse, que só sabia suportar, só sabia pedir perdão, só sabia perdoar, que só aprendera a ter a doçura da infelicidade, e só aprendera a amar, a amar, a amar. Imaginar que talvez nunca experimentasse o ódio de que sempre fora feito o seu perdão, fez seu coração gemer sem pudor, ela começou a andar tão depressa que parecia ter encontrado um súbito destino. Quase corria, os sapatos a desequilibravam, e davam-lhe uma fragilidade de corpo que de novo a reduzia a fêmea de presa, os passos tomaram mecanicamente o desespero implorante dos delicados, ela que não passava de uma delicada. Mas, pudesse tirar os sapatos, poderia evitar a alegria de andar descalça? como não amar o chão em que se pisa? Gemeu de novo, parou diante das barras de um cercado, encostou o rosto quente no enferrujado frio do ferro. De olhos profundamente fechados procurava enterrar a cara entre a dureza das grades, a cara tentava uma passagem impossível entre barras estreitas, assim como antes vira o macaco recém-nascido buscar na cegueira da fome o peito da macaca. Um conforto passageiro veiolhe do modo como as grades pareceram odiá-la opondo-lhe a resistência de um ferro gelado. Abriu os olhos devagar. Os olhos vindos de sua própria escuridão nada viram na desmaiada luz da tarde. Ficou respirando. Aos poucos recomeçou a enxergar, aos poucos as formas foram se solidificando, ela cansada, esmagada pela doçura de um cansaço. Sua cabeça ergueu-se em indagação para as árvores de brotos nascendo, os olhos viram as pequenas nuvens brancas. Sem esperança, ouviu a leveza de um riacho. Abaixou de novo a cabeça e ficou olhando o búfalo ao longe. Dentro de um casaco marrom, respirando sem interesse, ninguém interessado nela, ela não interessada em ninguém. Certa paz enfim. A brisa mexendo nos cabelos da testa como nos de pessoa recém-morta, de testa ainda suada. Olhando com isenção aquele grande terreno seco rodeado de grades altas, o terreno do búfalo. O búfalo negro estava imóvel no fundo do terreno. Depois passeou ao longe com os quadris estreitos, os quadris concentrados. O pescoço mais grosso que as ilhargas contraídas. Visto de frente, a grande cabeça mais larga que o corpo impedia a visão do resto do corpo, como uma cabeça decepada. E na cabeça os cornos. De longe ele passeava devagar com seu torso. Era um búfalo negro. Tão preto que a distância a cara não tinha traços. Sobre o negror a alvura erguida dos cornos. A mulher talvez fosse embora mas o silêncio era bom no cair da tarde. E no silêncio do cercado, os passos vagarosos, a poeira seca sob os cascos secos. De longe, no seu calmo passeio, o búfalo negro olhou-a um instante. No instante seguinte, a mulher de novo viu apenas o duro músculo do corpo. Talvez não a tivesse olhado. Não podia saber, porque das trevas da cabeça ela só distinguia os contornos. Mas de novo ele pareceu têla visto ou sentido. A mulher aprumou um pouco a cabeça, recuou-a ligeiramente em desconfiança. Mantendo o corpo imóvel, a cabeça recuada, ela esperou. E mais uma vez o búfalo pareceu notá-la. Como se ela não tivesse suportado sentir o que sentira, desviou subitamente o rosto e olhou uma árvore. Seu coração não bateu no peito, o coração batia oco entre o estômago e os intestinos. O búfalo deu outra volta lenta. A poeira. A mulher apertou os dentes, o rosto todo doeu um pouco. O búfalo com o torso preto. No entardecer luminoso era um corpo enegrecido de tranquila raiva, a mulher suspirou devagar. Uma coisa branca espalhara-se dentro dela, branca como papel, fraca como papel, intensa como uma brancura. A morte zumbia nos seus ouvidos. Novos passos do búfalo trouxeram-na a si mesma e, em novo longo suspiro, ela voltou à tona. Não sabia onde estivera. Estava de pé, muito débil, emergida daquela coisa branca e remota onde estivera. E de onde olhou de novo o búfalo. O búfalo agora maior. O búfalo negro. Ah, disse de repente com uma dor. O búfalo de costas para ela, imóvel. O rosto esbranquiçado da mulher não sabia como chamá-lo. Ah! disse provocando-o. Ah! disse ela. Seu rosto estava coberto de mortal brancura, o rosto subitamente emagrecido era de pureza e veneração. Ah! instigou-o com os dentes apertados. Mas de costas para ela, o búfalo inteiramente imóvel. Apanhou uma pedra no chão e jogou para dentro do cercado. A imobilidade do torso, mais negra ainda se aquietou: a pedra rolou inútil. Ah! disse sacudindo as barras. Aquela coisa branca se espalhava dentro dela, viscosa como uma saliva. O búfalo de costas. Ah, disse. Mas dessa vez porque dentro dela escorria enfim um primeiro fio de sangue negro. O primeiro instante foi de dor. Como se para que escorresse este sangue se tivesse contraído o mundo. Ficou parada, ouvindo pingar como numa grota aquele primeiro óleo amargo, a fêmea desprezada. Sua força ainda estava presa entre barras, mas uma coisa incompreensível e quente, enfim incompreensível, acontecia, uma coisa como uma alegria sentida na boca. Então o búfalo voltou-se para ela. O búfalo voltou-se, imobilizou-se, e a distância encarou-a. Eu te amo, disse ela então com ódio para o homem cujo grande crime impunível era o de não querê-la. Eu te odeio, disse implorando amor ao búfalo. Enfim provocado, o grande búfalo aproximou-se sem pressa. Ele se aproximava, a poeira erguia-se. A mulher esperou de braços pendidos ao longo do casaco. Devagar ele se aproximava. Ela não recuou um só passo. Até que ele chegou às grades e ali parou. Lá estavam o búfalo e a mulher, frente a frente. Ela não olhou a cara, nem a boca, nem os cornos. Olhou seus olhos. E os olhos do búfalo, os olhos olharam seus olhos. E uma palidez tão funda foi trocada que a mulher se entorpeceu dormente. De pé, em sono profundo. Olhos pequenos e vermelhos a olhavam. Os olhos do búfalo. A mulher tonteou surpreendida, lentamente meneava a cabeça. O búfalo calmo. Lentamente a mulher meneava a cabeça, espantada com o ódio com que o búfalo, tranquilo de ódio, a olhava. Quase inocentada, meneando uma cabeça incrédula, a boca entreaberta. Inocente, curiosa, entrando cada vez mais fundo dentro daqueles olhos que sem pressa a fitavam, ingênua, num suspiro de sono, sem querer nem poder fugir, presa ao mútuo assassinato. Presa como se sua mão se tivesse grudado para sempre ao punhal que ela mesma cravara. Presa, enquanto escorregava enfeitiçada ao longo das grades. Em tão lenta vertigem que antes do corpo baquear macio a mulher viu o céu inteiro e um búfalo.